sábado, 29 de novembro de 2008

Presente de Natal

Era a noite antes do Natal, e na rua imperava um silêncio total.
Devagar, ele ia vagueando a cidade sem um qualquer destino certo à sua espera.
11:24 da noite.
- Quase Natal – pensou ele.

Pôs as mãos nos bolsos rotos à procura de qualquer moeda perdida, com que pudesse matar essa fome que o descontrolava. Mas no fundo ele sabia que o que o mais incomodava (embora a fome fosse imensa) era o facto de ir passar mais um Natal sozinho. Já tinha perdido a conta de quantos eram os Natais que passava daquela forma (Mais de 10 certamente) mas ainda se conseguia lembrar do seu último Natal em família, e sabia-o com toda a certeza – O que mais lhe fazia falta, não era aquela comida imensa na mesa.. Não era a televisão ligada para o entreter horas a fio.. Não. Não era isso. Ele sabia que era o aconchego de uma família, de uma casa, de ter gente com quem contar. Ninguém conseguia imaginar o quanto ele sentia falta disso.
Ao lembrar-se disso as lágrimas vieram-lhe aos olhos (algo habitual naquela época do ano, era a mais difícil de suportar).
A ausência doía demais, e nem um ombro amigo tinha com quem desabafar. Falava sozinho, o que fazia as pessoas acharem que era maluco. Mas muito pelo contrário. Nunca tinha estado tão lúcido e com atenção ao que se passava em seu redor como naquele momento.

Ouviu sinos ao longe. - Meia noite – pensou ele.
Feliz Natal amigo – disse ele para si próprio enquanto se debatia por dentro com as razões que o faziam ainda querer viver esta vida.
Afastou os pensamentos, sabia que não lhe serviriam de nada. Ouviu risos atrás dele. Duma janela da casa que estava por trás dele, viu crianças a brincar e adultos a conversar. Mais memórias lhe vieram à cabeça. Boas memórias mas que doíam. Doíam-lhe lá no fundo. Continuou a andar para não os ouvir mais.
As pessoas iam passando raramente por ele, mas sempre com aquele olhar de desprezo que ele já estava habituado.

Pela 1ª vez deu consigo a desejar que tudo acabasse.
- Amigo, você está bem?
Não tinha reparado mas estava de joelhos no chão, cabeça para baixo e mãos na cara. A imagem lembrava-lhe o fim.
- Sim, estou bem obrigado. - Disse embora mentindo.
- Que faz aqui ao frio e à chuva na noite de Natal?
Não tinha reparado que chovia com alguma intensidade. Ele não lhe respondeu, apenas se levantou e o olhou com um olhar triste e sincero.
- Não tenho para onde ir – disse ele finalmente como que envergonhado.
- Venha comigo então. Arranjo-lhe um sitio onde passar este dia especial.
Sem uma escolha melhor, ele foi atrás do jovem que calmamente seguia o seu caminho.
- Aqui – disse ele.
Ele olhou e lá dentro, dezenas de pessoas, notoriamente na mesma situação que ele, estavam sentadas em diversas mesas comendo um simbólico jantar de Natal.
- É o meu restaurante – afirmou o Jovem com um ar sincero – Hoje ofereço-lhe um aconchego e comida.
Ele não sabia o que dizer. Claro que sabia que havia boas pessoas e com bom coração no mundo, mas era cada vez mais difícil de as encontrar. Sentou-se na mesa ao seu lado e visivelmente feliz com comida na mesa e pessoas à sua volta, dirigiu-se ao Jovem com um tom emocionado e lágrimas nos olhos e disse-lhe.
- Obrigado amigo, pelo melhor presente de Natal que alguma vez tive.



Que haja um pouco do bom coração do jovem em todos vocês.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Tudo é mágico

Tudo é mágico – Parece dizer esta casa.
As cortinas corridas, evitando a luz brilhante do sol, lá fora, escondem o pó acumulado entre os sofás, e os tapetes. Ao longe um velho piano pesado, deixa mostrar teclas suaves, e que pouco foram usadas nos seus dias.
Iria precisar de ser afinado – pensou ele.
No canto mais perto dele, viu aquilo que deveria ser restos de jornais. Imaginou o antigo dono, sentando na sua poltrona – agora coberta de pó – e a folhear lentamente o jornal, mantendo-se actualizado com o mundo, ao mesmo tempo que ia fumando um fumarento cachimbo. Tantas memórias perdidas entre as paredes daquela casa..
Um velho quadro, pendurado na parede à sua frente, prendeu-lhe a atenção. Era a foto de uma senhora idosa, a fazer o seu tricot, e com um pequeno gato a seu lado, enrolado a dormir. Uma imagem serena, e
conforme podia comprovar, tinha sido feito naquela casa. O Sofá retratado no quadro, era o mesmo em que ele se encontrava encostado.
Olhou em volta, estava tudo arrumado. Poderia até apostar que alguém tinha acabado de arrumar aquela sala, se não fosse o pó acumulado por toda a divisão. Procurou em volta por algo mais que lhe interessasse.
Até que a viu. A um canto, parcialmente escondida por tudo o resto. Pequena, com cerca de um metro – certamente não teria mais do que isso.
Aproximou-se e, instantaneamente, percebeu que seria com toda a certeza a mais bonita, e mais perfeita que já alguma vez tinha visto.
Estava ainda enfeitada. Fitas, bolas brilhantes, e até pequenas decorações a imitar as meias em que se costuma por os pequenos presentes, naquela noite tão especial. A pequena árvore de natal, coberta por uma pequena camada de pó, continuava perfeita, brilhante, e tinha ainda, a seus pés, uma prenda por abrir.
Ele chegou perto, e leu o cartãozinho que estava por cima do embrulho.
“Para ti, meu querido. Sempre e só para ti.”
Achou a dedicatória, tão especial. Tão perfeita.
Muito cuidadosamente, desembrulhou a pequena prenda, e abriu.
Ficou espantado quando a abriu. Não queria acreditar no que lá viu. Lá dentro estava...